quinta-feira, 15 de agosto de 2019



CONSCIÊNCIA E RESPONSABILIDADE

A História mostra que a racionalidade avançou e criou a possibilidade de as consciências se destacarem do registro da coletividade e incluírem, aos poucos, o empreendimento da individualidade. O coletivismo medieval, sustentado pela lógica paroquial, pela expropriação patrimonial coletiva, convivia com o patrimonialismo dos nobres que, se achando super-humanos e diferentes da massa, arrogavam-se o direito à posse individual de propriedades.
As transformações advindas do mercantilismo, base do pré-capitalismo, sustentaram o Iluminismo. Boa parte do renascentismo italiano foi financiado pelos mecenas, burgueses comerciantes. As revoluções culturais decorrentes puseram fim ao obscurantismo medieval.
Esse cenário demonstra que o avanço da cultura está para o capital assim como o obscurantismo da razão (ou a falta dela) está para as concepções coletivistas.
No mundo moderno, a ciência não resistiu nos países que adotaram ficções comunistas-coletivistas.
O desenvolvimento histórico da razão foi configurando o avanço da consciência individual. As nações (especialmente no oriente extremo) que não vivenciaram o término do feudalismo medieval e o surgimento do capitalismo, permaneceram alinhadas com uma consciência predominantemente coletiva. Alguma mudança desse cenário tem sido vista na China, quiçá por causa da produção em escala e modelo de trocas econômicas que enfraqueceram os baluartes culturais do comunismo chinês.
Sob o vértice ontogenético humano, o bebê emerge da ausência de consciência para uma protopercepção da realidade, que inicialmente é compartilhada com a mãe (no dois-em-um), para depois evoluir para uma consciência parcial da realidade externa que começa a abarcar a existência da mãe. Daí, o bebê avança para uma percepção, mais enriquecida, da existência do pai e do mundo.
Ao longo desse processo, o bebê constrói a noção da sua própria realidade (interior, individual) interagindo com a realidade exterior (inicialmente impessoal).
O ápice do desenvolvimento humano, portanto, está em ele poder se perceber como indivíduo e descolado da massa informe coletiva.
Individualidade e responsabilidade são facetas indissociáveis de uma moeda que é cunhada com dificuldade: enquanto não se é individual, se permeia a ilusão de que o coletivo é que sustenta tudo.
Quando o ente percebe que as duas coisas se influenciam ele, então, avança na qualidade de consciência, isto é, ele passa a usar o mundo e a tomar cuidado para não se converter em um peso abusado.
Em outras palavras, ele se torna responsável e passa administrar esforços para contribuir e receber da sociedade. Quando tal processo ficou incompleto ou impossibilitado, vai pairar a ânsia de retornar à primeira infância.
Frequentemente, temos visto gente grande querendo ser cuidada toda a vida pelo grupo. São incapazes de ser para, então, poderem fazer: são bebês chorões insaciáveis, que querem a recompensa sem esforço, o almoço grátis, um Estado para suprir, ao invés de a soma de esforços individuais.
A ilusão desses bebês crescidos pode também ocorrer por preguiça e por mau-caratismo.
A visão sistêmica possui valores. O que se foi não é o mesmo que vem: tem um "antes" e um "depois" e, entre esses dois momentos, existe o pegar da responsabilidade e o fazer escolhas orientadas para um nível mais alto de consciência individual.
A constelação sistêmica é um movimento de dizer “não” à herança do coletivo e de dizer “sim” à liberdade individual revestida de responsabilidade. Isso tem a ver com não deixar a conta para os outros pagarem.
A constelação não funciona muitas vezes porque alguém rejeita a responsabilidade: continua culpando a família, a empresa, a política, o presidente, etc.. Quem consegue realizar, pega a responsabilidade, avança; e quem não faz, choraminga, se vitimiza, enche o saco dos outros, envolvendo-os nos seus dilemas de estimação permanentemente abertos.
Em resumo, a expansão da consciência é um empreendimento individual possível para quem saiu da ilusão dos ideais coletivistas.
A moral da história é: se desenvolva, trabalhe, trabalhe, ajude quem precisa e pare de encher o saco.
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[Autor: Miguel Mello. Psicólogo. Constelador. Psicanalista. Doutor em Ciências Médicas. Mestre em Saúde Mental. Professor. Pesquisador. Escritor]
Recomendação de leitura: Constelações Familiares: evoluções



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