segunda-feira, 18 de junho de 2018

A Ajuda












A Ajuda


Jakob Schneider

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Como prestadores de ajuda, somos obrigados a colaborar no desenvolvimento de algo bom que faça progredir aqueles que se encontram em necessidade. A "ajuda" é uma faculdade que se baseia em treinamento e experiência [entendida num sentido profissional. (N.T.)]. Estamos acostumados a ver a faculdade terapêutica encaixada em instituições de psicoterapia e aconselhamento e em sua respectiva administração, que velam pelo desenvolvimento dessa faculdade e para impedir abusos em seu exercício. O trabalho das constelações familiares, como originariamente muitos outros métodos de ajuda, se desenvolveu fora da psicoterapia estabelecida e não reivindica lugar como um método terapêutico reconhecido. O que muitos teóricos e praticantes sentem como afronta no domínio da terapia é a observação de Bert Hellinger, partilhada por muitos consteladores - não por todos - que o trabalho com constelações vai muito além da psicoterapia.

 
Os críticos objetam que com isso se abrem amplamente as portas para tolices esotéricas. Afirmam que o trabalho com as constelações visa realmente efeitos terapêuticos e que por isso ele deve sujeitar-se às leis que regulam a terapia e às normas de uma terapia cientificamente controlada, ou deve deixar de existir. Neste particular também vem acontecendo importantes discussões entre os consteladores, e campo está aberto para o desenvolvimento. As "Ordens da Ajuda" de Bert Hellinger [Publicado no site www.hellinger.com ? existe uma tradução de nossa autoria, (N.T.)], que resumem sua longa experiência e suas convicções sobre o tema da ajuda, contém matéria explosiva que exerce provocação, tanto sobre a esfera externa quanto sobre o "cenário" dos consteladores:

 
Somente é capaz de ajudar quem assumiu plenamente os próprios pais e a vida. Só é capaz de ajudar quem renuncia a dar ao cliente mais do que ele precisa. Só pode ajudar quem tem a capacidade de dar o que o cliente necessita. Muitos ajudantes [no original, Helfer, entendem-se aqui sobretudo os profissionais da ajuda (N.T.)] correm o risco de que seu impulso de ajudar resulte de sua própria carência, de uma simpatia que se restringe aos fracos e às vítimas, e da pretensão de estarem á altura de todos os destinos de seus clientes. Toda ajuda deve ajustar-se às circunstâncias na vida do cliente e só pode intervir em caráter de apoio, e quando o permitam as circunstâncias. Somente respeita a dignidade do cliente a ajuda que não se coloca acima dessas circunstâncias, do destino do cliente e de sua vocação pessoal, de suas aptidões e de sua capacidade de decisão.

 
Na psicoterapia tradicional infiltraram-se padrões de pensamento segundo os quais os terapeutas poderiam ser mecânicos, juizes, cônjuges ou pais. Principalmente esta última tendência foi grandemente reforçada através do modelo teórico e do prático de transferência e contratransferência, com a "elaboração" de conflitos e a idéia de acompanhamento posterior com o correspondente prolongamento da terapia.

 
A constelação familiar não trabalha com transferência e contratransferência, embora não conteste a existência desses processos. Mas o constelador se desprende deles, da melhor forma possível. O terapeuta ou o aconselhador conduz o cliente, quando isso é necessário, diretamente para os pais dele. Ele só os representa transitoriamente e por pouco tempo, apoiando, por exemplo, a recuperação do movimento amoroso, sem colocar-se, entretanto, no lugar dos pais. Ele renuncia a acompanhar o cliente durante um período de sua vida e a oferecer-lhe um espaço de substituição ou de proteção para seu crescimento na segurança do espaço terapêutico. Ele só lhe dá um estímulo para o crescimento, geralmente sem acompanhar a realização de seu crescimento na vida concreta.
 

A constelação familiar, entendida desta maneira, não é uma terapia. Ela se assemelha realmente a uma "predição", um "oráculo" ou um "vaticínio", na medida em que traz à luz laços de destino e seus efeitos. Ela ajuda a "ver", sem buscar influenciar o que o cliente fará com ela, e sem que o ajudante desempenhe um papel nisso. Para além de uma "predição", a constelação também ajuda as pessoas a sentirem o próprio amor, freqüentemente oculto no destino cego. Ela possibilita abrir os olhos para o amor, estabelecendo relações cara a cara. E também aqui o terapeuta se coloca antes a serviço do diálogo do cliente com seu sistema de relações do que a si mesmo como interlocutor do diálogo.
 

A constelação familiar mostra os caminhos para uma compensação positiva em vez de uma compensação funesta. Ela fornece indicações sobre o que ordena as relações, tanto para o mal quanto para o bem. Ela faz confrontar, às vezes duramente, com a realidade, mas não diz o que a pessoa deve fazer ou deixar, ou como será seu futuro. Nesse particular, ela deixa a pessoa que busca auxilio sozinha, ou no círculo de sua família e de outras relações existenciais. Isso muitas vezes parece ser chocante para as pessoas no exterior, se bem que muitos clientes experimentem justamente essa atitude como confiável, aliviadora e fortalecedora, pois com ela são tomados a sério e se sentem livres.

 
Outra coisa que incomoda observadores externos é que os consteladores às vezes olham menos para o que o próprio cliente precisa do que para as necessidades de outros membros do sistema, principalmente dos excluídos ou incriminados. A principal atenção se dirige para a incorporação dos que estão separados num sistema de relações, e não apenas para o cliente e sua autonomia. O autêntico ajudante, no sentido de Bert Hellinger, resiste à diferenciação entre o bem e o mal e, com isso, à consciência pessoal do cliente. Ele antecipa a necessária ação do cliente, na medida em que dá em sua alma um lugar aos excluídos ou incriminados.

 
Ao abrirem um espaço para além dos efeitos da consciência do grupo, os consteladores têm em vista o que sugere a "grande alma" - um contexto que aponta para além dos grupos individuais - numa determinada situação de vida, como conveniente para o crescimento ulterior. Tanto a consciência pessoal quanto a coletiva são acolhidas numa espécie de consciência "universal", direcionada para o todo maior. Aqui a configuração de sistemas de relações também se distancia de uma psicoterapia e um aconselhamento puramente orientados para soluções. Abrese um nível mais espiritual, na medida em que se encara a ligação com algo "maior", que está fora de nossa disponibilidade e possibilidade. Orienta-se no sentido do crescimento e do desenvolvimento na direção de um "espaço aberto". Nisso reside o que na constelação familiar é "mais que uma psicoterapia".
 

A ajuda que ocorre no interior desse "mais" dificilmente se enquadra nas instituições de ajuda e em seus regulamentos. Nesse ponto se insere, talvez, a crítica dos teólogos e a luta contra o método das constelações, como se ele fizesse parte de uma cena esotérica. Como esse "mais" abrange aconselhamento e psicoterapia, e o trabalho das constelações se processa tanto dentro quanto fora das correspondentes instituições, os conflitos são facilmente compreensíveis e quase programados por antecipação.

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